Acervo 4 – Cachimbo em cerâmica

 

Fotografia do perfil  de cachimbo em formato de um"L" de cerâmica decorado com texturas.

Fornilho de cachimbo, Fortaleza São José da Ponta Grossa. Medidas: 2,5 cm x 13,5cm x 1,9cm.

Artefatos de cerâmica são comuns em sítios arqueológicos históricos. O barro cozido foi matéria-prima essencial para produção de telhas, lajotas, vasilhames cerâmicos e cachimbos como visto na imagem, encontrado na Fortaleza de São José da Ponta Grossa.

Em textos anteriores já mencionamos a importância dos artefatos cerâmicos para a arqueologia, como eram produzidos e utilizados por grupos Jê Meridionais e Guarani. Eles carregam consigo semelhanças técnicas e culturais que nos remetem a diferentes povos, particularidades regionais e períodos de fabricação.

No acervo proveniente da fortaleza há peças de origem local e importadas, de produção portuguesa, chinesa, inglesa, holandesa e francesa. A diversidade de técnicas em uso nos séculos XVIII e XIX produzia cerâmicas de barro, cerâmicas vidradas, faianças, porcelanas e grés. As peças fazem parte de um conjunto amplamente representado por louças, compondo parte dos utensílios destinados à armazenagem, transporte e preparo de alimentos. Também estão presentes fragmentos de cerâmica corrugada, um tipo de decoração associada aos Guarani. Ademais, a análise realizada pela arqueóloga Ana Cristina Sampaio (2021) observou a ocorrência de peças que não foram produzidas com o auxílio do torno (equipamento já difundido à época). Dentre elas havia temáticas decorativas que demonstravam similaridades a coleções encontradas em ocupações de escravizados afro-brasileiros e indígenas do interior de São Paulo e de São Francisco do Sul.

Cachimbos de barro cozido também são considerados suportes para representações culturais. A literatura arqueológica e histórica registra a presença de cachimbos em variados contextos, atestando o hábito de fumar como uma prática comum. O tabaco por vezes é mencionado como um gênero de primeira necessidade e sua produção no Brasil tinha importante peso na balança comercial. Especialmente consumido via cachimbo, tornou-se símbolo de marinheiros e soldados.

Ao analisar cachimbos cerâmicos de escravizados provenientes de São Paulo e do Rio de Janeiro, Camilla Agostini (1998) observou que a decoração desses materiais atuava como um marcador étnico em hábitos diários. Seu estudo comparou os estilos decorativos dos cachimbos com escarificações corporais presentes em pinturas e descrições documentais, identificando características que reforçavam a identidade africana e compunham estratégias de resistência cultural.

Até o momento, as pesquisas no acervo da Fortaleza de São José da Ponta Grossa identificaram seis cachimbos fragmentados, sendo um deles de origem europeia, provavelmente inglesa, moldado em caulim (argila com pouco ou nenhum componente que forneça cor a peça). Os demais exemplares são cachimbos de barro com decorações moldadas em relevo e linhas incisas. Apesar da necessidade de estudos mais aprofundados, há entre eles repertórios estilísticos condizentes com estéticas africanas ou afrodescendentes.

No âmbito da arqueologia histórica ainda há muito a explorar, e nesse sentido o MArquE segue atuando a favor da pesquisa, da valorização e da divulgação de coleções tão ricas quanto esta.

 

 

Para saber mais, sugerimos o acesso aos seguintes materiais:

Resistência cultural e reconstrução de identidades: um olhar sobre a cultura material de escravos do século XIX, artigo de Camilla Agotini.

A Pesquisa Arqueológica do Sítio Histórico São José da Ponta Grossa. publicação coordenada por Teresa Fossari.

Para além das muralhas: dos fragmentos ao monumento: Fortaleza de São José da Ponta Grossa, catálogo coordenado por Ana Cristina de Oliveira Sampaio e Bruno Labrador Rodrigues da Silva.